quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Il Primo Mese



Il Primo Mese
È próprio un inizio.
Pelo menos, de tantas formas diferentes, assim o sinto. As palavras vêm-me à boca de forma diferente, híbrida.
É verdade que tudo cansa, mas também que tudo entusiasma, tudo é um desafio de interpretação e descodificação. Quando o cansaço é demasiado, as palavras enrolam-se no cérebro, e por vezes exprimem-se em línguas que nem sabia existirem. É fácil irritar-me. Mas também é mais fácil acalmar-me, convencendo-me da necessidade de alguma condescendência, de algum distanciamento. Por vezes tudo parece uma comédia relativamente previsível, mas ainda assim hilariante (já não sei usar h’s).
Uma grande parte do tempo sinto-me a redescobrir a minha infância. A maravilhar-me com a genialidade de uma forma desconhecida de panela de pressão, ou a deliciar-me com uma expressão linguística que me cria novas imagens. Por vezes faço uma rima e sinto-me estupidamente feliz.
Não aprecio ser confrontada com ignorância ou estereótipos sobre e de Portugal. Di solito (significa, normalmente, mas tem piada só usarmos o antónimo: insólito…) sinto-me ultrajada, mas depois passa um bocadinho, afinal, somos pequeninos e absolutos apenas para nós próprios.
Agora que a o domínio da língua me permite um certo à vontade, cria-se uma espécie de falsa segurança que facilmente se desvanece: os mal-entendidos são comuns, é vulgar sair de casa sem perceber bem para onde devo ir, os avisos urgentes saiem sempre em português. Não é fácil gerir a vontade de arriscar e a cautela. Piano.
Em geral tenho bastante sorte, pois esperava-me já uma espécie de família bastante decidida a apoiar-me e apaparicar-me e, porque não, amar-me.  É também verdade que tudo é relativamente parecido para não me sentir excessivamente perdida (mas também para me criar uma falsa sensação de segurança…) e que os muitos anos de teoria de aprendizagem intercultural me têm dado uma mãozinha (as hormonas também ajudam ;-b).
Também é giro não perceber bem as coisas, compreender apenas parcialmente algumas regras, como se estivesse a entrar numa peça em que conheço apenas algumas personagens e algumas deixas… entretanto também me vou habituando às “brancas”, e já não me sinto tão melindrada por elas. Aceito que não posso perceber tudo, e por vezes deixo-me simplesmente ir.
Uma coisa é certa, nenhuma teoria me preparara para este cansaço instalado, omnipresente, a que de modo nenhum se pode render, porque senão não saio da cama. É mexer-me até morrer, e aproveitar ao máximo o belo do café, ao menos valha-me esse velho amigo!
De momento forrageio ginásio (palestra), mais cursos de italiano e um mestrado (che stancheza!), levanto-me às 6h da manhã para ir para Florença (80Km) e raramente me aguento lá pela tarde. De vez em quando estudo um bocado, entretenho-me a decifrar os supermercados e tento ler a Divina Comédia para crianças, em italiano, digamos que é um belo desafio.
Ainda há muito para explorar (a noite e a vida cultural, p.e.), mas de momento confesso-me demasiado cansada para tal, primeiro quero aprender esta língua esquisita e conhecer um pouco melhor a “família”. Tomar algumas decisões para o futuro também dava jeito (mas leva tempo, quando nem uma inscrição consigo fazer sozinha…).
Bom, de momento rezo para não ficar doente e ter que explicar a um médico italiano che cosa sento.